ISSN 2526-0596 (impresso) | ISSN 2526-2785 (online)
EDITORIAL
Lehi Sudy dos Santos
Perito Criminal Federal
Chefe do Serviço de Perícias em Balística do Instituto Nacional de Criminalística
Administrador Nacional do SINAB
Outubro de 2023 ficará marcado na história da Balística Forense do Brasil e da Criminalística em geral. Nesse mês finalizou-se a integração de todas as unidades da federação ao Banco Nacional de Perfis Balísticos (BNPB), completando o Sistema Nacional de Análise Balística (SINAB). Trata-se de um marco relevante pelo tempo que o assunto é debatido e almejado pela comunidade pericial, pelos desafios enfrentados para sua completa implementação e devido aos resultados já alcançados em um ano e meio de instalação gradual em todo país.
Quando ocorre o disparo de uma arma de fogo, são geradas marcas nos componentes da munição que funcionam como identificadores da arma empregada. Por meio de um exame realizado em microscópio óptico comparador, denominado confronto balístico, os peritos são capazes de responder, por exemplo, se determinada arma foi ou não utilizada para deflagrarum estojo encontrado em uma cena de crime, ou para disparar um projétil recuperado em um indivíduo alvejado, sendo incontáveis os casos já solucionados por meio desta técnica ao longo de mais de 100 anos. Todavia, com a popularização dos computadores, surgiu,nos anos 90, um grande avanço neste tipo de exame com a criação de Comparadores Virtuais, também denominados Sistemas de Identificação Balística. Trata-se de equipamentos eletrônicos utilizados para capturar imagens dos elementos de munição, armazená-las em banco de dados e realizar correlações automatizadas entre perfis balísticos extraídos desses elementos. Mesmo que não substituam o perito, estes equipamentos auxiliam muito,pois geram uma lista de candidatos mais prováveis para que o perito analise as imagens e encontre ligações que seriam impossíveis de serem encontradas sem a solução.
Diante deste avanço tecnológico, foi previsto na Lei 10.826 de 22 de dezembro de 2003, conhecida como estatuto do desarmamento, um banco de dados de todas as armas fabricadas no país. Não há como detalhar o tamanho deste desafio, tendo em vista o volume de armas que isto representa, suas variabilidades, bem como demais detalhes envolvidos neste tipo de correlação. Trata-se de uma tarefa quase inatingível e, do ponto de vista da solução de crimes, muito inefetiva. Entretanto, o dispositivo legal levou a debates e iniciativas que culminaram no acréscimo do art. 34-A, prevendo um Banco Nacional de Perfis Balísticos (BNPB) para “elementos de munição disparados por armas de fogo relacionadas a crime”. Este tópico foi considerado, por especialistas no tema, como muito mais apropriado e factível.
A implementação da rede iniciou-se em janeiro de 2022 com distribuição de equipamentos, adequação de laboratórios e treinamentos, em um investimento expressivo dos Governos Federal e Estaduais, completando-se em outubro de 2023. Com pouco mais de um ano e meio de implementação gradual, os resultados são espetaculares. Já foram cadastrados, no BNPB, mais de 24.000 elementos de munição coletados em locais de crime, ou de armas de fogo apreendidas. Por meio da análise das listas de correlações do sistema, os peritos já encontraram mais de 970 ligações confirmadas. Em 345 destas ligações, foram identificadas as armas utilizadas em crimes, e nas demais, foram descobertos crimes perpetrados em locais e datas diferentes com emprego da(s) mesma(s) arma(s) de fogo. Para demonstrar ainda mais a efetividade do SINAB, registrou-se que em 93% dessas ligações não havia solicitação de confronto balístico, ou seja, não fosse o sistema, essas associações não seriam encontradas.
Como exemplo, cita-se um indivíduo preso com uma arma de fogo e que, em princípio, responderia pelo crime de porte ilegal. Mas, após inserção dos padrões da arma e busca no banco de dados balísticos, constatou-se que a arma havia sido utilizada meses antes em um homicídio de grande repercussão. Ou, outro exemplo, coletaram-se, em um grande assalto ocorrido em um determinado estado, mais de 1.000 estojos deflagrados que foram preparados, triados e inseridos no BNPB. Meses depois, ocorreu uma tentativa de assalto em um estado vizinho àquele. Por meio do cadastro deste caso no banco, identificaram-se três armas utilizadas nas duas ocorrências. Ademais, duas dessas armas foram ligadas a homicídios cometidos a mais de 650km de distância de um dos assaltos. E os resultados da investigação não param! Um novo assalto, em um terceiro estado, também deixou elementos de munição e armas apreendidas que já foram associadas a esses dois assaltos prévios e a outros dois ocorridos nas regiões Norte e Sul do país, a mais de 3.600km de distância um do outro. A movimentação das armas, e a forma como são repetidamente utilizadas nos crimes, começam a ser mapeadas.
Os resultados são impressionantes! Mas, mais animador ainda quando se percebe que é só o começo. Quanto mais peritos forem treinados e mais laboratórios forem estruturados para trabalhar no protocolo do SINAB, muito mais crimes cometidos com uso de arma de fogo serão solucionados.
EDITOR-CHEFE
Pablo Alves Marinho
Perito Criminal do Instituto de Criminalística de Minas Gerais
Farmacêutico e Mestre em Ciências Farmacêuticas
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Perito Criminal do Instituto de Criminalística de Minas Gerais
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Perito Criminal do Instituto de Criminalística de Minas Gerais
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Perita Criminal do Instituto Médico Legal de Minas Gerais
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Perita Criminal do Instituto de Criminalística de Minas Gerais
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Perita Criminal do Instituto de Criminalística de Minas Gerais
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Perito Criminal do Instituto de Criminalística de Minas Gerais
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Adelino Pinheiro Silva
Perito Criminal do Instituto de Criminalística de Minas Gerais
Engenheiro Eletricista e Doutor em Engenharia Elétrica
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